(Exalted) O Impuro

- O que você está fazendo?

Aquele. Aquele era o Deva que por tanto tempo havia procurado. Ali, trancado, aprisionado dentro dos conceitos mais básicos da Criação. A pureza daquele ser ali, envolta em sentimentos de um impuro que havia atravessado as montanhas da Lança que Viola o Céu em busca de respostas, de iluminação.

Calma, a criatura apenas sussurrava seu intento em murmúrios incompreensíveis, que chegavam não ao ouvido do Escolhido, mas à sua alma impura. O ser, o raríssimo ser, era incapaz de compreender o que se passava. Sabia quem ele era, sabia que ele, em um passado tão antigo que haviam poucas estrelas no céu, havia desafiado e o enfrentado. Reconhecia sua alma, seu espírito, sua essência.

O homem não respondeu. Se ele pretendia violar o seu próprio céu, seu próprio limite, deveria encontrar uma fonte pura que pudesse guiá-lo em direção a transcendência. E ele sabia, pois a Lança que Viola o Céu havia lhe ensinado, que uma daquelas criaturas poderia ser encontrada se ele rasgasse cada grilhão espiritual que possuísse. Se ele demonstrasse que estava disposto a purificar-se e avançar no seu caminho de iluminação. Se queimasse na mais pura chama espiritual. Talvez, apenas talvez, ele reverteria sua situação. Apenas talvez, ele encontraria o que procurava.

O Deva, em sua sabedoria de Eras, então, entendeu. E em sua sabedoria, ele apenas aguardou, quando o Príncipe do Sol Esverdeado deu um passo adiante e abraçou as chamas purificadoras e consumiu a si e ao ser primordial.

E ali, naquele instante ele também compreendeu... que a Lança que Viola o Céu havia o levado a acreditar que seria através do suicídio ritual que ele transcenderia. Da auto mutilação. Quando, na verdade, aquele passo não era necessário. Aquele passo era apenas um jeito de tornar o seu caminho mais difícil, mais... sem sentido, infinito. Naquele momento ele compreendeu... seria capaz de finalmente alcançar o céu que a lança procurava.

E aquele mesmo Céu que a Lança buscava violar constantemente, tornou-se ciente.

"Ele" havia tornado-se algo mais...

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Normalmente os demônios não dão atenção aos mortais que vivem na Cidade de Bronze. Eles são vistos, em sua maioria, como pouco mais do que ratos que rastejam entre as camadas do Primordial, esgueirando-se furtivamente e buscando alimentos.

Em alguns casos raros, estes mesmos mortais se encontram e formam pequenos grupos, pequenas sociedades. A coletividade é, afinal, um traço inerente do ser humano. Eles se agregam, se misturam quando sozinhos e se afastam, em egoísmo, quando confiantes.

Assim, pequenas e furtivas comunidades formaram-se ao longo das sempre mutantes camadas de Malfeas. Algumas encontraram lugares realmente seguros, por se tratarem de pontos onde os demônios menores tinham medo de entrar e os maiores não davam importância, criando sociedades maiores. Eram, sim, frágeis. Afinal, humanos, e algumas poucas Crias Demoníacas, sobrevivendo em um mundo onde seus corpos poderiam ser destruídos em um mero gesto, mas, como baratas e outros vermes, persistentes.

Shayla foi uma destas comunidades. Foi, porque hoje, tudo o que resta dela são os cadáveres de seus integrantes. Escondiam-se em um pequeno complexo subterrâneo nas entranhas do Rei que Ainda Permanece, atacavam, em grupos, demônios mais fracos e dividiam os espólios. Confiantes, chegaram a sair de seu pequeno território e realizar pequenos furtos.

Talvez, se fossem apenas demônios, a pequena Shayla teria prosperado e se tornado um feudo regular. Talvez, quem sabe, até mesmo um poderoso feudo.

Contudo, esta história é sobre humanos.

Enquanto tornavam-se confiantes, corrupção e soberba foi semeada naqueles corações sobreviventes. Seu líder, Elric, um típico homem do Sul da Criação que fora levado como escravo por demônios, tomou ciência de que uma sociedade semelhante vivia em localidades próximas.

Em poucos meses, eles atacaram esta, e outras duas sociedades, anexando-as aos seu "território".

E foi neste momento que outros tomaram ciência daquele pequeno e curioso grupo de baratas. Foi naquele momento que Blaviken, O Devorador das Virtudes, viu a oportunidade de que um interessante teatro se formasse. Meticulosamente, ele trouxe Shayla à atenção de alguns grupos de demônios. Fracos para conquistá-la, mas forte o suficiente para abalar sua confiança.

Em seguida, ele matou, furtivamente, os mais fracos da sociedade, apenas para despertar o terror. Blaviken conhecia os humanos, conhecia a capacidade de adaptação e sabia que eles se superariam na dificuldade. Sabia que eles encontrariam um meio, por mais baixo que fosse...

E foi o que aconteceu.

Elric acreditou que seria capaz de vencer aquela guerra, ainda que atuando como baratas, como guerrilheiros. Desesperado, ele tomou outras sociedades, juntou mais alguns homens e os uniu sob seu estandarte. Com cuidado, ele, e seu pequeno grupo de heróis, enfrentaram e subjugaram pequenos grupos infernais que tinham conhecimento daquelas baratas. E, quando as "batalhas" terminaram, Elric recebeu a aproximação de Blaviken...

Elric, líder de Shayla e de mais outras 7 sociedades, vendeu-se ao Devorador das Virtudes. Ele entregou a capacidade de importar-se com os outros, em troca de poder. Ele, e seus seis mais próximos e fiéis homens, tornaram-se Crias Demoníacas.

E então, finalmente, eles marcharam, em sua arrogância, contra o feudo de uma das almas de Malderada...